O homem é um ser complexo, constituído de mais do que matéria. È também um ser intelectual e espiritual, ou moral.
No limiar do séc. XXI e nas sociedades industrializadas o homem tem, aparentemente, tudo o que precisa ter para ser feliz. Senão, que diríamos das populações africanas que hoje passam fome, vivem sem o conforto das nossas casas, sem ar condicionado, deslocam-se a pé, alimentam-se (muito mal) do que produzem quando o ano é favorável à colheita, muitas vezes oprimidas, sem liberdade de pensar e com acesso ao conhecimento muito limitado? E no entanto, sem tecnologias, sem informação, sem globalização - são felizes, mais felizes pelo menos do que o homem da nossa sociedade.
O conceito de felicidade é abrangente. Tem a ver com o homem integral. E nas sociedades industrializadas em que o homem vive numa aldeia cada vez mais global, pela técnica, a Internet e toda a facilidade de acesso ao conhecimento, está cada vez mais só, mais entregue ao seu próprio sentimento.
O homem sente que não é dono de si, do seu tempo e da sua vontade. Não pode fazer o que deseja e pensa que é importante pois é movido pelo urgente e por uma imensa vontade de ter. Por isso, corre velozmente parando apenas o necessário para respirar... e sobreviver. Não tem o prazer de escolher, porque não tem tempo e por isso não vive, sobrevive. Sim, porque o livre exercício de escolha é condição indispensável à vida. Não escolhe o que come, nem o que ouve, ou o que aprende, ou com quem partilha, porque não tem tempo e serve-se do que está à mão.
Não constrói para si mesmo mais do que um reino material, uma carreira e uma conta bancária. Tudo para descobrir que afinal está só e sofre, mas não sofre sozinho. Consigo, arrastados pela força do ritmo da vida vão aqueles que um dia fez nascer, num momento em que experimentou (talvez) o verdadeiro sentido de viver e se abriu para partilhar de si – do seu interior. Foi a experiência da alegria que só pode ter-se quando damos de nós, compreendendo que somos muito mais do que aquele forma de matéria pensante e andante e que a nossa felicidade só se encontra naquilo que partilhamos com os outros.
Um certo pregador escrevia os seus sermões em duplicado. O original ficava guardado nos seus arquivos, o duplicado era oferecido a um dos seus amigos mais íntimos. Um dia o fogo destruiu completamente a igreja onde pregava e tinha o seu gabinete e com ela todo o seu espólio. Os livros que mais prezava e... os originais de uma vida de pregação. Ao olhar para as cinzas declarou: Só sobrou aquilo que dei.
Esta é a crise em que o homem se encontra: a crise de si mesmo. Vive cada vez mais para si, isolado nas paredes do seu interesse e do seu egoísmo, construindo pela vivência diária a sua própria prisão.
O homem precisa encontrar-se. Olhar para dentro de si e descobrir quem é, onde está e para onde vai. Descobrir o sentido da vida para além de si mesmo. Olhar para o círculo mais íntimo, mais perto si, o seu círculo familiar e descobrir que essa é a extensão da sua própria vida, da sua própria pessoa. È aí que realmente vive e é quem é, que estabelece inevitavelmente uma forte influência, positiva ou negativa, conforme a escolha. Esse é o centro mais importante do seu próprio investimento como ser e no entanto, inadvertidamente, com quem está cada vez menos comprometido. O homem está em crise sim, uma crise de valores. E o resultado dessa ausência traduz-se num estilo de vida impregnado de hábitos nocivos, limitativos outra vez do poder de escolha.
É o caso do álcool, por exemplo. Começa por ser um elemento de socialização mas depressa se transforma numa corrente que amarra a mente e rouba a liberdade. Traz à tona tudo aquilo que existe de maléfico no ser humano pela incapacidade de escolher as palavras, as atitudes e os comportamentos. E de elemento de socialização o álcool torna-se motivo de exclusão / isolamento.
O desejo de acesso fácil à riqueza e de rápida ascensão a um status sócio-económico elevado é outra razão que conduz o homem á aquisição de hábitos nocivos, como o jogo ou o trabalho. O primeiro cega-o pelo desejo compulsivo de ganhar levando-o a perder tudo: a honestidade, a honra e a prudência. O segundo origina uma condição em que é motivado apenas pelo desejo de ter, valorizando demasiadamente o que faz no caminho para o alcançar. Reduz a sua vida a essa experiência, sujeita-o a uma situação de stress contínuo e constitui ameaça para a sua saúde física, mental, espiritual e social. Rouba-o da alegria de viver, do prazer de relacionar-se pelo que os outros são mais do que por aquilo que podem dar-lhe no sentido de lucro imediato do que pode ser materialmente medido. A verdadeira liberdade só pode ser encontrada quando o homem entende, aceita e aprende a relacionar-se interiormente consigo e com Deus e exteriormente com o outro. Estas são dimensões da sua vida que não pode, simplesmente, ignorar.
O homem está em crise, em crise de si mesmo. Dos valores e dos relacionamentos.
O homem precisa encontrar-se consigo, com Deus e com os outros. Então encontrará a verdadeira felicidade.